Lá se vão 20 anos desde que, com os resultados alcançados com a aclimatação de uvas no planalto catarinense, deu-se início à implantação de vinhedos comerciais em São Joaquim.

Os acurados testes tinham sido feitos na década de 1990 pela Empresa de Pesquisa Agropecuária de Santa Catarina, EPAGRI, sendo que a vinícola Quinta da Neve – citada mais adiante – foi a primeira a apostar na produção de vinhos finos na região, ainda no ano 2000.

Saliente-se, de início, como a vitivinicultura brasileira tem evoluído para ampliar o espaço que ocupa no nosso mercado – quem acompanha esta série de 293 artigos, dos quais 40 sobre o vinho no Brasil, bem o sabe – expandindo-se e se modernizando para atender consumidores cada vez cada vez mais seletivos e exigentes. Merece destaque, por exemplo, a identificação de áreas novas (no RS e fora dele) e de novos procedimentos (dupla poda, irrigação) para o cultivo de viníferas e elaboração de vinhos finos, diversificando e melhorando a qualidade e expandindo o conhecimento da bebida. O Município de São Joaquim, SC, onde se acha a cidade mais fria do Brasil, demonstrou ser uma dessas alternativas. Características climáticas especiais fazem dele uma área privilegiada para a prática de certos tipos de agricultura – batatas, frutas europeias… – pouco encontrados em outras regiões brasileiras, sendo a viticultura de altitude uma dessas atividades.

Distante 220 km de Florianópolis, o município assenta-se em posição geográfica em que a latitude, desfavorável em princípio, é compensada pela altitude média de 1.330 metros acima do nível do mar, atingindo 1.700 metros em certos pontos, com relevo ora plano ou ondulado, ora montanhoso.

 

Tais altitudes elevadas, em que as 4 estações do ano se diferenciam com nitidez, originam condições climáticas – verões frescos; temperatura média anual de 13ºC , sendo 9º C no inverno e 18ºC no verão – que propiciam a maturação das uvas de forma lenta e constante originando cachos de qualidade ótima para elaborar vinho. Na contramão, merecendo atenção especial, tem-se ali pluviosidade elevada (entre 1.300 a 1.900 mm por ano) e geadas  frequentes. Além disso o clima de montanha propicia formações anuais de neve que fazem a alegria dos turistas, suscitando o desenvolvimento do eno-turismo no local, o que, descontando-se o período da pandemia, já é uma realidade. Não é por nada que o primeiro vinhedo comercial, plantado na  altitude  de 1.150 metros, foi batizado de Quinta da Neve por seus proprietários.

A vinicultura em São Joaquim entra na terceira década deste século, consolidada. Demonstra essa afirmação uma dezena de vinícolas em produção, de tamanho entre pequeno e médio, com produtos presentes no mercado brasileiro, como Leone di Venezia, Suzin, Villa Francioni, Vinícola d’Alture, Monte Agudo, Quinta da Neve, Villagio Basseti… e assim por diante.

A  Quinta da Neve foi a primeira a apostar na elaboração de vinhos de altitude em São Joaquim. Em 1999 os quatro sócios iniciais da vinícola, entre eles o nosso conhecido Acari Amorim, compraram uma área de 87 hectares no distrito de Lomba Seca distante 30 quilômetros do centro da cidade começando o plantio no ano 2000. Lançou seu primeiro Pinot Noir, talvez o melhor já elaborado no Brasil, em 2005.

A vinícola, que conta agora entre seus sócios com a família Hermann (importante distribuidor de vinhos de Blumenau) cultiva 25 hectares de Sauvignon Blanc, Chardonnay, Cabernet Sauvignon e Pinot Noir.

Vinícola Suzin – Outra pioneira no cultivo de viníferas em São Joaquim é a Agro Suzin, um empreendimento fruticultor do planalto catarinense. A Vinícola Suzin fica localizada  em São José do Alecrim, a 20 Km de São Joaquim, à altitude de 1.160 msnm. Teve início em 2001 com a implantação de 10 hectares de vinhedos por iniciativa do empresário local  Zelindo Melci Suzin, contando com Cabernet Sauvignon, Merlot, Pinot Noir e Sauvignon Blanc. Seus primeiros exemplares de Cabernet Sauvignon e Merlot 2006 foram apresentados com sucesso na Expovinis 2008 em São Paulo. A gerência, que cabia ao patriarca Zelindo, é hoje conduzida por seus filhos Luiz e Everson Suzin, por um Engenheiro Agrônomo e quatro técnicos, produzindo anualmente 40 toneladas de Cabernet Sauvignon. O produto é  vinificado em São Joaquim e comercializado principalmente na Região Sul.

Villa Francioni  –  O ano de 2002 foi um marco na vinicultura joaquinense na medida em que, nesse ano, o empresário Dilor Freitas, de Criciúma, SC, lançou seu projeto da vinícola Villa Francioni. A empresa dispõe de dois vinhedos, um no município de Bom Retiro, a 960 metros do nível do mar, com Chardonnay, Merlot e Cabernet Sauvignon, e outro em São Joaquim, a 1.290 msnm, com  Sauvignon Blanc, Cabernet Franc, Cabernet Sauvignon, Merlot, Malbec, Pinot Noir e Shiraz.

A cantina, inaugurada em 2004, tem 4.400 metros quadrados de área construída e  conta com capacidade produtiva para 300 mil garrafas por ano. Foi construída em desnível aproveitando a topografia local, não usando bombeamento para as transferências de uva e vinho, além de contar com engarrafamento automatizado. Seus rótulos incluem as linhas Villa Francioni, Joaquim e Aparados. A administração cabe aos sucessores de Dilor, já falecido, e a parte técnica ao enólogo Orgalindo Bettu, especialista em tintos ao estilo de Bordeaux mas cujo Chardonnay Villa Francioni está certamente entre os melhores – se não é o melhor – do Brasil.

Monte Agudo – Fundada pelo médico Leônidas Ferraz e pelo produtor de grãos Alceu Muller, a vinícola Vinhedos Monte Agudo na Rodovia SC 438, km 69,5, deu início ao plantio com mudas vindas da França no início de 2005 em terrenos a 1.280 metros de altitude, Foi adotada a condução das videiras no formato Y (mangedoura) para maior exposição solar das variedades Sauvignon Blanc, Chardonnay, Cabernet Sauvignon e Merlot. Resultam vinhos brancos leves e frescos e tintos de boa complexidade e capacidade de guarda.

O gerenciamento da Monte Agudo cabe aos sucessores do Dr. Leônidas, seus filhos Carolina, Patrícia e Leônidas Filho.

A pequena  Villaggio Bassetti tem vinhas em altitudes entre 1.260 e 1.320 metros acima do nível do mar.  Elaborou seu primeiro vinho em 2008, um Cabernet Sauvignon fermentado em barrica. Os Bassetti trouxeram da Itália a tecnologia que usam na elaboração com prensa pneumática, tanques espelhados e higienização com vapor.

Vinícola D’Alture uma experiência muito simpática para quem deseja conhecer o funcionamento da elaboração de vinhos em São Joaquim. Vale à pena a visita degustando seus vinhos com uma tábua de frios até o fim do dia, vendo o Sol se pondo atrás das montanhas.

Driblando a limitação de espaço, cito adicionalmente, mesmo sem terminar a lista, a Quinta de Santa Maria com 40 hectares de vinhedos dispostos em patamares ao lado do Rio Lavatudo, tendo como carros-chefes os vinhos Portento e Utopia, e a Vinícola Leone di Venezia, de estilo italiano tanto na arquitetura da propriedade quanto nas uvas quanto nos vinhos ali elaborados quanto na simpatia da recepção.

Não há dúvida, amigos, irmãos no confinamento. São Joaquim, no planalto catarinense, está incluído firmemente no mapa vitivinícola brasileiro atual. Deixou de ser a promessa do ano da passagem do século para se consolidar neste incrível ano de 2020.