Ainda que contemporâneas, Barbe-Nicole e Antônia Adelaide não se conheceram pessoalmente, o que não é de se estranhar, pois a primeira nasceu e passou toda a sua vida em Reims, França, enquanto que a segunda nasceu e morreu em Peso da Régua, Portugal. Tiveram em comum o fato de enviuvarem cedo e despertarem, com isso, a vocação empresarial, constituindo um império no mundo do vinho, uma com o  Champagne, a outra com o Vinho do Porto.

francesa, filha do industrial Nicolas Ponsardin, casou-se com o empresário François Cliquot envolvido em atividades bancárias, comércio de lã e vitivinicultura, passando a se chamar Barbe-Nicole Clicquot-Ponsardin (1777 – 1866). François veio a falecer em 1805. Aos 27 anos, a viúva Clicquot assumiu o comando do empreendimento, dedicando-se ao aprimoramento e elaboração de Champagne.  Até então, a segunda fermentação resultava em um vinho turvo, devido aos restos de leveduras na fermentação em garrafa. Com a introdução da remuage en pupitres – rotação manual da garrafa em cavaletes – a viúva Clicquot reinventou o Champanhe na primeira metade do Século XIX e expandiu espetacularmente as vendas dentro e fora da França, tornando-se uma das mais ricas empresárias da Europa. Ainda hoje a empresa que ela criou leva seu nome, Maison Veuve Clicquot-Ponsardin. Os vinhedos de propriedade da Maison atual cobrem 400 hectares que se espalham sobre as melhores áreas de cultivo da Champagne.

 

A portuguesa Antonia Adelaide Ferreira (1811 – 1896) também era de família abastada. Casou-se em 1834 com seu primo Bernardo Ferreira de quem ficou viúva aos 33 anos. Assumiu, então, a direção da propriedade em meio a dificuldades, comandou a luta contra as enfermidades da vinha enfrentando a falta de apoio governamental e viajou para o exterior, a fim de se inteirar dos processos mais modernos na produção do vinho. Investiu na implantação de vinhedos em áreas mais ensolaradas sem abandonar as plantações de oliveirasamendoeiras e cereais. Era conhecida como Ferreirinha, pelo cuidado e carinho com que tratava as famílias dos trabalhadores locais, dando nome posteriormente à atual Casa Ferreirina. Quando faleceu, aos 85 anos, deixou enorme fortuna incluindo trinta propriedades rurais.

Tinha uma predileção especial por sua Quinta do Vesúvio em Foz Coa, no Alto Douro. Pertencente agora ao Grupo Symington, a Quinta do Vesúvio dispõe atualmente de uma área total de 326 hectares, dos quais 133 são dedicadas ao cultivo. O restante está conservado no estado natural, sem intervenção humana, o que consagra a antiga propriedade da Ferreirina como uma das maiores vinícolas da região do Douro.

Seja pelas coincidências em suas histórias pessoais, seja pelo extraordinário legado que nos chegou, Antonia (Ferreirinha) e Nicole (La Grande Dame) formam uma dupla fora de série neste nosso Fantástico Mundo dos Vinhos