Com suas cidades históricas, Tours, Blois, Orléans e outras, castelos como os de Amboise e Chambord, e fortalezas como as de Chinon e Angers, o Vale do Rio Loire (lê-se luar), no noroeste da França, constitui extraordinário patrimônio arquitetônico que ilustra, ainda hoje, os ideais do Renascimento e do Iluminismo na Europa Ocidental. Entre os castelos e palácios ali existentes, alguns servem como moradia, outros são explorados como hotéis ou pousadas, e os demais abrem suas portas para visitantes e turistas. Ao lado de tais atrações, o vale dispõe de inúmeros vinhedos e vinhos de renome, não havendo uma unidade nos tipos de uvas e nos estilos de vinhos em cada uma das sub-regiões ao longo do rio. As denominações Muscadet, Anjou, Touraine e Sancerre diferem entre si, tendo em comum a leveza e o refinamento dos vinhos e a proximidade do rio Loire e de seus afluentes.
Organizei para você, querida leitora, caro leitor, um passeio pela região, partindo da costa Atlântica para o interior, aliando, a cada cidade ou monumento, os dados da área vinícola que lhe é próxima.
Saímos, então, de Nantes em direção à cidadezinha de Clisson, ali perto, no rio Sèvres. Clisson dispõe de um ar italiano que não se encontra em nenhum outro lugar na França, como se pode ver no Castelo de Clisson, sobre uma rocha; no Mercado Central do século XV; nas duas pontes medievais; no Templo da Amizade; e na Catedral de Notre Dame, criações de estilo peninsular. A atração vinícola dessa área é o Muscadet, vinho branco seco da uva Muscadet ou Melon de Bourgogne, particularmente o Muscadet Sèvre-et-Maine Sur Lie, acompanhante ideal das ostras, pela acidez e pelo sabor particular que lhe é dado pelo amadurecimento sobre as lias ou borras, isto é, sobre as leveduras mortas (sur lie). Veja-se por exemplo aqui no Brasil o Muscadet Sèvre et Maine sur Lie Château des Gillières (Decanter).
Seguimos de Clisson para leste, passando por Doué-la-Fontaine, a capital francesa das rosas, até chegar a Saumur, às margens do Loire, uma cidade apaixonada por cavalos e pela cavalaria, com seu Musée du Cheval, além do significativo Museu de Artes Decorativas. Como atração central, o Castelo de Saumur, conhecido como “Castelo do Amor”, modelo para o castelo da Cinderela na Disney. Em termos de vinhos destacam-se o espumante Saumur Brut da uva Chenin, o rosé conhecido como Cabernet de Saumur, e os tintos da Cabernet Franc de Saumur-Champigny, de cor intensa, em que amora, cassis e violeta surgem com nitidez, mesmo para os degustadores menos experientes.
Se agora nos voltarmos para noroeste, seguindo pela margem do Loire, chegaremos ao seu afluente, o Rio Maine, sobre o qual se encontra Angers, o lar do Cointreau, no coração do distrito de Anjou. Cidade universitária com parques e jardins em profusão, Angers conta com uma enorme fortaleza Plantageneta, com torres cilíndricas, e também com a Catedral de Saint Maurice. No interior da fortaleza a maior atração é a Tapeçaria do Apocalipse, a mais longa tapeçaria do mundo. Nas proximidades de Angers dois vinhos brancos bem diferentes fazem a alegria do visitante: o seco Savennières e o doce Bonnezaux, ambos da uva Chenin Blanc.
Pertinho de Angers a comuna de Savennieres, na margem direita do Loire, apresenta terrenos de xisto e areia, onde a Chenin origina vinhos secos verdeais com aromas florais, de marmelo e mel, frescos e leves, que necessitam de certo tempo após a safra para mostrar todo seu potencial. No Brasil contamos com alguns deles, por exemplo, o Savennières Clos du Papillon, do Domaine Baumard (Mistral).
Ali perto, mas agora no afluente Layon, a Chenin é atacada pela Botritis, dando lugar a vinhos licorosos, muito longevos, rescendendo a acácia, abacaxi, laranja, baunilha e mel, companhia de qualidade para o Roquefort, o foie gras ou mesmo para o pâté de campagne.