Você é daqueles que, quando alguém fala em sobremesa, pensa logo em comprar um Sauternes? E é daqueles que acha que só daquela região da França são provenientes bons vinhos de sobremesa? Ou mesmo que em outros países não há nada tão especial assim, que não possa ser provado ou servido em seu jantar especial?
Então, faça como os nossos colegas dos grupos 524 e 528 da ABS – Barra da Tijuca, que enfrentaram esse desafio e foram buscar alguns excelentes vinhos que acompanham sobremesas, obedecendo as regras fundamentais de harmonização ensinadas pelo Prof. Euclides.
Eles selecionaram sete exemplares (sendo três portugueses, dois franceses, um italiano e um espanhol), que receberam excelentes notas nas degustações realizadas.
Faça a prova com a sua sobremesa preferida ou experimente-os na quietude de seu cantinho predileto.
Saúde!!
Marsala Superiore Vintage – 1987 – 19% (grillo)
Marco de Bartoli – Sicília – Itália
A vinícola está em Samperi, a 12 km de Marsala, no extremo oeste da Sicília, um dos lugares mais invadidos do mundo no decorrer da história. Uma região de clima quente, com baixa precipitação de chuva e grande distensão térmica entre dia e noite. Nas colinas, há um pouco mais de umidade e frescor. O terreno é arenoso e calcário. Os vinhedos são de 1970 a 1996, conduzidos por guyot ou alberello, com 3500 plantas/ha e rendimento de 20 hl/ha. As uvas são colhidas muito maduras e então desengaçadas. Ocorre uma prensagem delicada, seguida de decantação. A fermentação é feita em barricas de carvalho ou castanheira, sem controle de temperatura. Uma parte do mosto é fortificada com álcool antes do início da fermentação. Uma fortificação adicional é feita quando se atinge o teor de açúcar desejado. Um vinho potente, fresco, alcoólico, amadeirado, que tem capacidade de guarda de muitos anos. Sua passagem durante 20 anos em grandes tonéis de carvalho lhe dá essa qualidade. Cor de mogno de média intensidade, muito viscoso e brilhante. Nobreza olfativa muito particular o caracteriza, com aromas de compotas de cítricos, tâmaras secas, avelãs, folhas de tabaco. Muito impactante no paladar, perfuma o palato e é muito persistente no fim de boca. Sugere-se degustar a 14º C, ou mesmo mais fresco. Um crítico sugere sua degustação como vinho de meditação escutando a Sinfonia n. 2 de Beethoven. Excelente com a pasticceria seca siciliana, como torroncini, cannoli recheado com ricota de ovelha, mustaccioli, arabeschi. Perfeito para queijos curados, gorgonzola, grana, pecorino com ervas, frutas recheadas de marzipã, bolo de amêndoas, ou mesmo com um bom charuto de média estrutura. Recebeu nota 94 do monitor e média de 92,5 atribuída pelo grupo. Distribuído pela Decanter.
Quinta da Gaivosa Porto Tawny 20 Years Old – NV – 19,5% (Touriga Nacional, Touriga Franca, Tinta Barroca, Tinta Roriz e pelo menos + 10 outras)
Domingos Alves de Souza – Douro – Portugal
A Quinta da Gaivosa pertence ao afamado vinicultor português D. A. de Souza e fica na região de Santa Marta de Penaguião, no Baixo Corgo, em uma área de 25 hectares onde são plantadas as mais variadas castas portuguesas. As vinhas estão localizadas à margem direita do Rio Corgo. Uma verdadeira salada de uvas, pois, além das já conhecidas TN, TF, TB e TR, este vinho é produzido com mais de 10 outras castas, muitas delas de vinhas centenárias. Um produto do Douro, da sub-região Baixo Corgo, um local protegido pela serra do Marão da influência do Atlântico e um dos mais frescos e úmidos do Douro, com cerca de 800 mm/ano. No verão, temperaturas de até 35º C. Solo xistoso com presença de argila, com exposição sul. A colheita das uvas é feita manualmente, às vezes em locais de difícil acesso. Processa-se à fermentação de forma tradicional, com leveduras indígenas, de 20º a 25º C por 3 a 4 dias. Interrompe-se à 77º V/V para adição da aguardente vínica. Amadurece em média durante 20 anos em carvalho francês. Estimativa de guarda de 5 a 8 anos. Deve ser bebido entre 13º e 15º C, acompanhando com harmonia doces da pastelaria portuguesa, como pastéis de Belém, pastel de Santa Clara, travesseira de Sintra, torta de nozes, ou mesmo como acompanhamento de charutos. Um vinho âmbar, com finos aromas de amêndoas, nozes, tabaco, figo seco e caixa de especiarias. Intenso e de notável persistência. As notas recebidas foram: monitor 94, média 92,85. Distribuído pela Decanter.
Coteaux du Layon Carte D’Or – 2013 – 12% (Chenin Blanc)
Domaine des Baumard – Loire – França
O Loire produz alguns dos melhores vinhos brancos da França, principalmente os de Pouilly-Fumé e Sancerre. Acredita-se que as primeiras uvas vieram com os romanos há pelo menos 2000 anos, herança essa que foi passada aos monges, que mapearam as melhores regiões e vinhedos. Sua exploração foi facilitada pelo próprio rio que dá nome à região e pelo fato de que, com o casamento entre nobres de Anjou e Aquitaine, a Inglaterra tornou-se um grande parceiro comercial da França. Provavelmente a casa Baumard é a maior especialista em Chenin Blanc e uma das mais renomadas empresas do Loire e da França. Robert Parker a considera um dos melhores domaines do mundo. Seus Savennières e os renomados Quarts de Chaume são muito disputados no mercado mundial, a exemplo de nosso vinho acima. É em Rochefort-sur-Loire, no coração do vale do rio Loire, a 20 km ao sudoeste de Angers, que se situa o Domaine. São 40 ha divididos pelo rio Loire, em solo de xisto com arenito, sendo as instalações em um pequeno chateau do final do século XVIII. Florent, filho do fundador, é o responsável desde 1987. As primeiras vinhas no local foram recenseadas em 1634. A colheita é feita com seleção por triagem sucessiva, das uvas mais maduras e atacadas pela podridão nobre, de vinhedos localizados na região do Coteaux du Layon (seis ha). Prensagem pneumática, com suavidade. A vinificação é feita em tanques de aço, longa e controlada, em baixa temperatura, sem passagem por madeira. Permanecem nove meses sobre as lias. Vinho de interessante complexidade, grande equilíbrio e refrescante acidez. Uma bebida de corpo médio, que se sugere servir de 7º a 9º C, como acompanhamento de sobremesas suaves e queijos azuis. Ou mesmo com pratos como patinho com laranja e peixes cremosos. Aromas de maçã verde, marmelo e manteiga, com suave cremosidade em boca e um toque de gengibre. Tem guarda de 5 a 10 anos. Notas 93 do monitor e 91,14 do grupo. É importado pela Mistral.
Rainwater Medium Dry – NV (engarrafado em 2016) – 18% (Tinta Negra Mole)
Blandy’s – Madeira – Portugal
A vinícola foi fundada em 1808 por John Blandy, recém-chegado da Inglaterra, e é consagrada como uma das melhores produtoras de vinho da Madeira. Até hoje permanece nas mãos da família. Foi seu filho Charles quem adquiriu, em 1840, o “Blandy’s Wine Lodges” (armazéns de vinhos) existente até hoje em Funchal, capital da Madeira. Em 1989, associaram-se aos Symingtons, do Porto, fundando a Madeira Wine Company, uma parceria ainda existente. Uvas provenientes de diferentes vinhedos plantados entre 300 e 400 metros, no norte da ilha, perto de São Vicente. A fermentação ocorre em tanques de aço com leveduras selvagens e temperatura controlada (entre 24º e 26º C). Depois de uns quatro dias é feita a fortificação com álcool vínico (brandy), com o objetivo de parar a fermentação, preservando-se o açúcar residual. Depois, é transferido para tanques estufa onde passa por um processo cíclico de aquecimento e arrefecimento entre 45º e 50º C por um período de três meses. Concluída a estufagem, o vinho repousa três anos em barricas de carvalho americano. Segundo o produtor pode ser guardado por mais de 10 anos. Um vinho de várias nuances, com aromas de pera, abacaxi, doce de maçã e nozes. Rico, com final amanteigado. Seu nome provém da história de um barril de Madeira que foi esquecido numa doca e sofreu infiltração de água da chuva, gerando um vinho mais suave. Deve ser servido entre 11º e 13º C, sendo um delicioso aperitivo e também excelente companhia para sobremesas com pouco açúcar, devido ao seu caráter levemente adocicado e a presença de frutas secas. Pode também ser degustado com salada de frutas e abacaxi, tortas adocicadas, queijos fortes e chocolate. Muito bom com café. Tem 78 g/l de açúcar residual. Foram atribuídas as notas 92 pelo monitor e 91 pelo grupo. É importado pela Mistral.
Pedro Ximenez Solera 1927 – 16% (Pedro Ximenez)
Alvear – Montilla – Espanha
Originária de Burgos (Castilla y Léon), a família Alvear chegou a Montilla (ao sul de Córdoba) no início do século XVIII. Diego de Alvear y Escalera funda a vinícola em 1729 e é hoje uma das bodegas de maior prestígio na região de Andalucia. O método de produção dos vinhos de solera (utilizado nos Jerez) utiliza a crianza dos vinhos “generosos”, de onde se vai retirando parte do vinho mais antigo das botas (tonéis de 550 litros, de carvalho americano), para as soleiras (os barris que ficam mais perto do solo, daí o nome soleira). Por sua vez, a parte retirada dos barris superiores (chamados de criadera) é substituída pela colheita mais recente. O método de soleira leva vários anos até ter a idade e corte adequados, sendo, portanto, bastante trabalhoso e custoso. O resultado desse método, contudo, é muito compensador, pois gera vinhos saborosos, untuosos, uma verdadeira sobremesa por si só! Neste vinho, o corte inclui vinhos de 1927, resultando na safra informada no rótulo. A produção se faz de uvas passificadas ao sol, com uma maturação posterior em carvalho americano, com retiradas e adições que podem durar cinco anos. Resultado varietal das uvas Pedro Ximenez, é uma bebida de cor âmbar (o produtor identifica como cor de mogno), muito escura e brilhante, muito elegante. No nariz denotam-se aromas de frutas secas e passas, nozes, figos caramelizados, muito intenso e persistente. Na boca é doce, saboroso, encorpado, muito denso, com mel e passas, e longa persistência. Pode ser degustado de 10º a 12º C, sozinho, após a refeição, ou acompanhando castanhas, petiscos à base de carne de porco, sobremesas com caramelo ou doce de leite e queijos azuis. Robert Parker atribuiu-lhe uma nota 96 e o Guia Peñin, de Espanha, 90. Em nossa degustação, o monitor atribuiu 93 o grupo 92,5. Vinho distribuído pela Península.
Muscat de Beaumes de Venise – 2010 – 16% (Muscat a petit grains)
Yves Nativelle (Domaine de Coyeux) – Beaumes de Venise (Rhône) – França
A origem dos vinhedos de Beaumes de Venise pode ser traçada desde 600 anos antes de Cristo, quando uma comunidade grega instalou-se aos pés das montanhas. Um pouco a nordeste de Avignon, a cidade dos papas, e pouco ao norte de Carpentras, aos pés das lindas montanhas Dentelles de Montmirail, criou-se o pequeno vinhedo de Beaumes de Venise, que produz um vinho doce natural, de grande notoriedade. Os romanos o chamavam de “o vinho das abelhas”. Yves e Catherine Nativelle são os proprietários do Domaine de Coyeux, o maior da apelação e que representa quase a metade da produção desta. Seus primeiros vinhedos datam de 1950. Um vinho doce natural que, na realidade, é um vinho fortificado obtido pela adição de aguardente de vinho (neutro) quando da fermentação alcoólica das uvas. Com isto, a fermentação se bloqueia, preservando uma grande quantidade de açúcar residual (por lei, no mínimo 110 g/litro de mosto). A casta é a Muscat a petit grains ou Muscat de Frontignan a petit grains. Colhida à mão e em parcelas, para evitar a sua oxidação, é desengaçada e prensada levemente. Convertida em mosto, é transferida para tanques de inox termorregulados em 4º a 6º C, para preservar a extração de aromas. A fermentação demora duas a quatro semanas e interrompida como acima explicado. Diferentes tiragens são feitas de acordo com a idade das vinhas, a maturação das uvas e as parcelas. A mistura entre as tiragens é feita no fim do inverno (fevereiro/março). Repousa alguns meses nos tanques e mais seis a oito meses na garrafa. Gera um vinho de roupagem pêssego, com aromas delicados da uva Muscat e frutados diversos como casca de laranja confit, geléia de pêssego, tílias e rosas. Na boca, um vinho licoroso, macio, com notas frutadas e um excelente equilíbrio, destacando-se a laranja e o damasco doces. Um vinho ideal para aperitivo ou para acompanhar uma sobremesa à base de frutas em caldas, como abacaxi, figos e pêssego, ou mesmo um foie gras e queijos azuis. Essa casta possui a característica de apresentar-se em duas variedades, uma com frutos escuros e outra com dourados, mas ambas produzem vinho doce. Servir de 6º a 8º C. Em nossa degustação recebeu as notas 94 do monitor e 92,92 do grupo. Distribuído pela Taste Vin.
Graham’s Six Grapes (Porto Reserva) – NV – 20% (Várias)
Graham’s (Symington Family) – Porto (Douro) – Portugal
A família Graham elabora vinhos no Porto desde 1820. A família Symington, por outro lado, tem uns 100 anos menos nessa área, mas por volta de 1970 adquiriu a vinícola dos Graham, declarando nesse auspicioso ano o seu primeiro vintage. A família Graham voltou a produzir há umas duas décadas e hoje mantém a marca Churchill Graham no mercado, igualmente no Porto/Douro. Situada em local privilegiado em Vila Nova de Gaia, a Graham’s abriga cerca de 2000 pipas e 40 tonéis ou balseiros de envelhecimento de Porto, além de extensos depósitos de Porto Vintage maturando nas garrafas. Paredes de meio metro de espessura e o clima marítimo do local asseguram uma temperatura fresca e constante, ideal para o envelhecimento lento. O exterior, do início do século XIX, permanece intacto, tendo sido reinaugurado pelo presidente de Portugal em 2013. Na opinião de Robert Parker e alguns outros especialistas, a Graham’s é hoje a melhor e mais reputada casa de Porto. O Six Grapes é um Ruby Reserva (Vintage Character), elaborado com uvas de vinhedos selecionados da Quinta dos Malvedos e da Quinta das Lages e de outras três, que também dão origem aos Porto Vintage. O Six Grapes lembra muito um Vintage, mas a maturação em cascos de carvalho em vez de garrafa lhe confere maior maciez, sendo acessível mais cedo. O nome Six Grapes deriva da classificação que a família dá aos vinhos, indicando aqueles que têm maior potencial para ser Vintage. Na produção do Porto, a fermentação alcoólica é interrompida, com adição de aguardente vínica. O vinho ainda maturou durante três ou quatro anos em tonéis de carvalho. De cor rubi muito escura, tem um rico perfume de ameixas maduras e cerejas, além de frutas secas. No palato, é complexo, com boa estrutura e longo final. Servir de preferência um pouco fresco, ao final de uma refeição, ou com café, chocolates, queijos fortes. Recebeu nota 91 da Wine Spectator e em nossa degustação 93,5 do monitor e 92,18 do grupo. É distribuído pela Mistral.