Como procurei mostrar em artigo anterior, alguns aromas predominam em vinhos tintos, como é o caso da cereja na Pinot Noir, da amora no Bordeaux Rouge e da ameixa nos Malbecs argentinos, enquanto que outros são mais fáceis de encontrar em vinhos brancos, como o abacaxi no Chardonnay catarinense ou a lichia no Gewürztraminer alsaciano.

As modalidades de fermentação – em branco, sem as cascas; em tinto, junto com as cascas das uvas tintas – justifica em parte a diferenciação. Assim, aromas cujos precursores vêm da casca da uva tinta – amora, mirtilo, ameixa, framboesa… – destacam-se preferencialmente em vinhos tintos.

 

Os que vêm da polpa – acácia, maçã, melão, grapefruit – surgem mais comumente em vinhos brancos.

Mas há muitos aromas que são comuns a brancos e tintos e isso é fácil de explicar caso a caso.

Vinhos que passam por barrica, por exemplo, tanto brancos quanto tintos, tendem a apresentar um aroma de baunilha já que o carvalho tem entre seus componentes a vanilina. Pode nesse caso surgir também um aroma lácteo, em brancos e tintos, como o da manteiga, se durante o afinamento inicial na barrica foi permitida a fermentação malolática.

É também o caso da baunilha em vinhos brancos californianos oak aged assim como em tintos da Merlot da Serra Gaúcha, amadurecidos em barricas de carvalho.

Sem esquecer que a passagem por madeira pode transferir aromas tostados – de caramelo, tabaco, café… – tanto para brancos como para tintos, bastando que o tostado interno da barrica seja de médio para forte.

Eu havia apontado e detalhado, no artigo anterior, os aromas de violeta, banana, amêndoa e café comuns a tintos e brancos.

Nas linhas a seguir adiciono mais quatro aromas comuns de dois – rosa, anis, cogumelos, cravo-da-índia – que tive a oportunidade de perceber em diferentes degustações ao longo do tempo, em vinhos finos brancos e tintos, e também rosados, de todo o mundo vinífero.

As informações adicionais têm por base meu livro Degustando Vinhos (Editora Mauad X)

ROSA

Aroma primário floral, o perfume da flor da roseira enriquece o leque aromático de vários brancos, rosés e tintos, tendo como princípio químico o geraniol que surge na fermentação. Pode-se esperar por ele em brancos sem madeira de Gewürztraminer, Moscatel e Torrontés e em tintos da Merlot e da Pinot Noir. Não espere, porém, em exemplares amadeirados nem em tintos muito robustos.

Rainha das flores em muitas civilizações, na mitologia grega a rosa era tida como flor preferida de Afrodite, deusa do amor e da beleza. Encontrei o perfume dessa rainha em um Colomé Torrontés, argentino de Salta e em um Marcel Deiss Gewürztraminer Bergheim, da Alsácia, bem como no tinto Merlot Lídio Carraro, do Vale dos Vinhedos, na Serra Gaucha.

Não me esquecendo, se me permitem, do caráter róseo do argentino Penedo Borges Rosé de Malbec.

ANIS-ESTRELADO

Aroma primário de especiarias, o perfume refrescante de anis pode estar presente tanto em brancos da Chenin Blanc e da Riesling quanto em tintos da Pinot Noir, por exemplo. Sua presença em vinhos brancos do sul da França chega a ser notável.

Tendo por princípio químico o anetol, seu odor é comum a várias plantas como a erva-doce, o anis verde (do licor anisette) e o anis-estrelado de origem chinesa. É de tal forma concentrado que o óleo de anis era besuntado nos pombais para que os pombos-correio memorizassem seu domicílio e retornassem.

Não tive dificuldade em identificá-lo no Savennieres Coullet de Serrant, do Loire, no Laxas Albariño, de Rias Baixas, mas também em um tinto Clos de Vougeot Domaine Faivelay, da Borgonha.

 

COGUMELOS

O odor de cogumelos no vinho é aroma terciário que tem por base química o octenol, que aflora no envelhecimento. Essas curiosas plantas sem clorofila (do latim cucumellum) são fungos visíveis que surgem na terra úmida multiplicando-se rapidamente e têm uma distante porém consistente ligação com os vinhos já que as leveduras causadoras da fermentação também são fungos.

O aroma de cogumelo ou dos “champignons de Paris” em vinhos maduros – não confundir com cheiro de mofo – intensifica-se quando a bebida é exposta ao ar no decanter ou no copo. Encontra-se em brancos doces botritizados, em brancos secos maduros e também em tintos finos envelhecidos. Pude percebê-lo várias vezes, por exemplo, no Tokaji Aszu Essencia Pendits 2000 e no Barbaresco Montefico Riserva 2009.

CRAVO-DA-ÍNDIA

Seu perfume é muito conhecido, pois dá origem ao eugenol, antisséptico amplamente utilizado em odontologia. Parece-se com um pequeno prego, daí seu nome (do latim clavus = prego). Trata-se também de um aroma terciário que tem o eugenol por princípio químico e que pode ser identificado sem muito esforço em vinhos doces botritizados como Sauternes e Quarts de Chaume. Mas você pode encontrá-lo nos tintos franceses do Rhône com predominância de Syrah, como no Côte Rôtie e no Hermitage.

Originado na Indonésia, o cravo tem sido usado na Ásia como odorizante há mais de dois mil anos. Consta que na China Imperial as cortesãs tinham de perfumar o hálito com cravo-da-Índia para poder se apresentar ao Imperador. Tive a oportunidade de identificá-lo tanto no branco Sauternes Château de Fargues 2007 quanto no tinto Delas Frères Côte Rôtie Landone 2012.

Quatro aromas comuns a brancos e tintos, bem diferentes uns dos outros e sempre bem vindos.